sexta-feira, 31 de outubro de 2014

’Bora irritar o pseudo-Califa!

Este post destina-se a evitar a necessidade de, num outro post que conto publicar ainda hoje, abrir um longo parêntese a explicar por que chamo “Daish” ao proto-estado terrorista que surgiu na Síria e no Iraque, em vez de recorrer a designações mais comuns, como “Estado Islâmico”, “E.I.”, “EIIS”, “EIIL”, “I.S.”, “ISIS” ou “ISIL”.

A designação “Estado Islâmico”, além de ser a que eles preferem — o que só por si é razão para a rejeitar —, dá-lhes uma dignidade que eles não merecem. Acho que devemos evitar isso.
(Ao contrário de alguns apologistas, não sou de opinião que os terroristas do Daish «nada têm a ver com o Islão» — mas conceder-lhes alguma legitimidade nesse domínio, ainda que não totalmente descabida, é em última análise altamente contraproducente. Evitemo-la, portanto.)

Siglas como “E.I.”, “EIIS” e “EIIL”, resultantes de diferentes designações da organização em português, vão contra uma certa tradição de designarmos entidades estrangeiras pela sigla na língua original: donde, ETA (basco), IRA (inglês) e PKK (curdo), para referir apenas algumas.

As correspondentes em língua inglesa — “I.S.”, “ISIS” e “ISIL” — são ainda mais descabidas: nem são na nossa língua, nem na língua “oficial” dos terroristas, o árabe.
(Obviamente, boa parte dos membros do Daish sabem de árabe pouco mais do que «Allāhu akbar» e «sallallāhu ‘alayhi wa sallam» — da mesma forma que os católicos iam pouco além do «Ora pro nobis» quando o Latim era a língua oficial da sua religião.)

E assim chegamos a “Daish” (ou “Daʿish”).
O termo é um feliz acrónimo: simultaneamente uma sigla e uma palavra por direito próprio. Como sigla, é a transcrição do original árabe (داعش), sendo a designação corrente no Médio Oriente, incluindo entre os seus inimigos de língua curda; corresponde ao português EIIL e ao inglês ISIL, resultando de «الدولة الإسلامية في العراق والشام» ou «Estado Islâmico do Iraque e do Levante». Mas داعش é também, alegadamente, uma palavra árabe em si mesma, criando um trocadilho que irrita os terroristas assim designados: significa, de forma ironicamente certeira, «um intolerante que impõe as suas ideias aos outros».

Mas o valor de designar este proto-estado terrorista por um termo derrogatório vai bem para lá do prazer de irritá-los: as palavras são importantes; uma designação negativa mina a dignidade da coisa designada, diminuindo, ainda que marginalmente, a sua atractividade.
(Podemos ter certa afinidade por um qualquer Movimento Europeu pela Revogação dos Direitos de Autor — mas aderiríamos com convicção, e não por derisão, a um grupo chamado MERDA?...)

Querem melhor razão para adoptar o termo Daish?!

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